sexta-feira, 25 de junho de 2010

Como você está?

Eu estou ótima
Por mais que as flores do meu jardim sejam apenas flores
As mesmas de qualquer um
Não ligo para o que estão cochichando por aí
E sim para o que estão espalhando
Sou daquelas que se fazem entrar por um ouvido
E sair pela boca

Eu estou bem
Os três ponteiros e o tic tac não me consomem fácil
Eu os consumo todos os dias
Otários
Ninguém é de ninguém
Só de si mesmo

Eu estou indo
Entre bons e maus bocados rascunho a vida
Sem pretensão alguma de estar certa
Apenas de viver
E ser vivida

Eu estou de mal a pior
Rastejo todos os dias para o juízo final
E, lá chegando, rio
Rio como se fosse a última vez
Com tudo que me resta

Eu estou assim
Oscilando
Sendo

Não é assim que as coisas deveriam ser?

domingo, 13 de junho de 2010

Com todo sentido possível.

Contemplei o pôr-do-sol, sentada em um tijolo. Daqui, percebo que o infinito não está longe, é só virar a primeira direita. Não faz muito tempo desde a última vez que mudei. Esta é uma das coisas que ainda pretendendo entender. Detenho-me ao sopro, assim, vejo ir embora.

Tiro os pés do chão toda vez que me acho capaz de levitar. O tijolo me prende. Ainda. O esconderijo cintilante guarda abraços e desprezos. O único ainda fiel. Não dou a mínima para os três corridos ponteiros. Bolas de sabão superam-se sozinhas. As observe estourando.

A noite deita em cachos simétricos. Duas estrelas rebeldes ainda me mantêm imóvel no bosque movimentado. Ouço teorias complexas na brisa musicada em dó, cheia de dó. Fiz questão de acompanhar todas as notas em um agradável chá.

Trouxe rapidamente o frio até meus ombros descobertos e vulneráveis. Esperei o quente confortante, que, distraído, dormiu. Sonhos sussurravam apoiados em mim.

Amanheceu e o que ainda tenho para oferecer é um tijolo: meu passado.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Não, sim.

Eu não pedi para ser assim
ainda chego em casa e largo minha bolsa no chão
dou três ou quatro goles na garrafa de água
e parto para o banheiro

Quando olho no espelho a única
coisa que penso é que
não pedi para ser assim

Caminho até os discos e escolho
cuidadosamente só um
isso tudo enquanto
a voz da Rita soa no roda
roda musical

Passo os dias indo e vindo no chacoalhar
de um ônibus qualquer
Acordo quando meus olhos abrem
e durmo quando eles decidem
fechar

Não pedi para ser assim,
mas é
e sou

domingo, 30 de maio de 2010

Saindo da caverna

Você se acha esperto demais. Mas imagine só: você não sabe de nada. Nem eu, nem ninguém. A vida é muito mais, muito mais, do que isto. Muito. Muito mais. Quando te vejo deitado na sua cama de medo curtindo o conforto, sinto vontade de correr para longe. Bem longe. Até quando nós vamos viver nos escondendo? Se você me der uma data certa, consigo esperar até lá. Diga-me, ou faça isso parar. Agora.

Cinco, quatro, três... O relógio começou a andar ao contrário. Como vamos sair daqui? Não tem saída! Pelo amor de todos os santos daqui e de lá, me tire daqui. Vai, corre também. Está me escutando? Olha pra mim, eu consigo tirar a gente daqui. Confia. Confia. Cinco, quanto, três.

Confia. Abra os ouvidos, de alguma forma você conseguirá me escutar. Abaixe esses braços, não levante as mãos para o céu. Que céu¿ Estamos aqui. Presos a terra. Somos as raízes, deveríamos ser árvores. Estamos cada vez mais entranhados, precisamos sair daqui!

Cadê você? Pare de se esconder atrás do passado. Tem muito mais pela frente. Muito mais. A nossa vida não acabou, não vai acabar nunca. Solte minha mão. Você está presa demais. Não vou conseguir te tirar daqui. Eu sei, vou me salvar sozinha.

Você não vê saída? Eu vejo.

sábado, 29 de maio de 2010

Assunto importante

Esta será a última vez que falo de amor.

















Porra!

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Parabéns, este é teu presente.

Hoje acordei com um bolo avisando que tenho 30 anos. Muitas pessoas (cinco) batiam palmas, aplaudiam sei lá o quê. Eu estava deitado, e olhei tudo do ângulo mais desfavorecido possível. Todos estavam com gogó grande, quadris largos e céus da boca profundos. Aquilo me fez lembrar de outro bolo, mais gentil, que contava bem baixinho sobre meus 8 anos bem vividos. Minha mãe, meu pai cantavam sussurrando e Lucy desbravava meu rosto com sua língua canina.

Ai, que primavera maravilhosa. Acordei com um afago na cabeça e por uma fração de segundos vi o dia ensolarado. Uau, eu estava fazendo 8 anos, meu quarto era azul e nada me deixava mais contente do que ver o He-man enorme do lado do meu espelho. Eu esperava ganhar o Pégassus. Um carrinho dourado de controle remoto. Não ganhei, já vou logo adiantando.

Meu pai abriu um sorriso largo e disse: “Filho, teu presente está te esperando lá fora.” – ótimo. Joguei a coberta do Mickey longe e corri até o jardim. Nada me esperava lá fora, a não ser grama, uma macieira, na qual meu pai vivia se gabando por ter, e uma bola jogada no canto direito, perto do muro. Fiquei uns 10 minutos, sem exagero nenhum, gritando e procurando o presente – enquanto meus pais riam da porta de casa.

Eu diria hoje que aquele riso todo foi desnecessário. É muita sacanagem fazer isso com um moleque de 8 anos, cheio de ansiedade correndo na veia e sem os dois dentes da frente. Eu já estava emocionalmente abalado, uma seqüência de risadas era o que menos precisava.

Minha mãe finalmente resolveu cessar meus gritos desesperados de “cadê, cadê, cadêêê” e apontou para a macieira dizendo que ela era meu presente. Isso mesmo, eu havia sido presenteado com uma árvore. Uma bonita e robusta árvore. Macieira. Entendeu? ÁR-VO-RE. Olhei atônito para meus genitores e recebi de volta olhos ternos como quem diz “E aí? Gostou?”

Caminhei fincando meus passos no chão até o presente e, com toda minha fúria infantil, o chutei. Quebrei o dedão. Enquanto eu gritava de dor e desapontamento, meu pai corria até mim. Passei a manhã no hospital de pijama, e voltei com o dedo enfaixado. Passei a tarde inteira no meu jardim olhando para árvore e imaginando por que meu pai havia tido a infeliz idéia de me dar aquilo. “A macieira nem dá maçã direito”, pensava entre as lágrimas grossas.

Hoje estou aqui, olhando para as palmas de Júlia, Paulão, Roberto, meu pai e minha mãe. Paulão e Roberto são meus vizinhos no prédio. Júlia é minha prima que mora comigo aqui na capital para estudar artes cênicas. Meu pai e minha mãe... Bom, eles são, respectivamente, meu pai e minha mãe. Depois de 22 anos percebo que deveria ter dado valor àquela árvore no exato momento em que a recebi.

Ela foi minha confidente por anos, dormia comigo depois de ter lido em voz alta livros e mais livros sobre homens e mulheres que sofriam e amavam, me olhava todas as vezes que eu chegava em casa e era nada mais (muito mais) que uma árvore. A minha árvore que se perdeu no cotidiano.
Queria a Lucy me lambendo o rosto, o He-man me olhando e a macieira no jardim nessa primavera maravilhosa. Mas meu passado não será nunca meu presente.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Realeza da realidade.

Eu era o rei do mundo. Ao acordar, ordenava o sol, que prontamente nascia no céu alaranjado. Meus passos eram meus súditos, iam para onde eu bem entendesse. Sem nem ao menos reclamarem. O tempo clamava misericórdia, mas de nada adiantava. Cortava seus segundos, minutos e horas sem piedade.

Quem havia me nomeado rei? O vento sussurrou perto do meu ouvido esquerdo. Disse com todas as palavras que eu era quem o fazia ventar. Oras, nada é mais poderoso. Ditava sorrisos, danças e abraços. Guiava bocas, mãos e pensamentos. Estabelecia desordem à ordem.

Ao fim do dia, quando as estrelas já estavam pontilhando o azul escuro, sentava em meu trono de veludo vermelho e vestia a coroa de sonhos. Diante dos meus olhos fechados, vi guerras apocalípticas, abertura de mares e tranças caindo de janelas. As árvores me reverenciavam e as formigas abriam passagem. Simplesmente me sentia nada mais do que o rei do mundo.

Hoje, abro os olhos e o sol já nasceu. Meus passos andam sem me ouvirem e o tempo zomba de minha vagareza. Sorrisos, danças, abraços, bocas, mãos e pensamentos decidiram por si só acontecerem. Quando olho para o céu, duas ou três estrelas ainda brilham. Ninguém declara guerra, Moisés não abre mares e Rapunzel cortou as traças. Árvores existem e formigas persistem.

O mundo é meu rei. Estou de joelhos esperando ordens.