terça-feira, 7 de julho de 2009

Prefiro

Prefiro os peixes e não os cães
Pois não me lambem quando chego em casa
Pois não me dão carinho quando chego em casa
Prefiro os peixes e não os cães

Prefiro os peixes e não os gatos
Pois não se enroscam em minhas pernas no frio
Pois não querem dormir comigo no frio
Prefiro os peixes e não os gatos

Prefiro os homens e não os peixes
Pois me dão carinho quando chego em casa
Pois querem dormir comigo no frio
Prefiro os homens e não os peixes

sábado, 27 de junho de 2009

Nada muito diferente - II.


Caminhava na Mathew Street, tentando não respirar o ar europeu, apesar de tudo sentia falta do Brasil. O sol permanece em silêncio, assim como eu, aguardando seu momento de estrelato. Caminho na Mathew Street sobre paralelepípedos uniformes, tentando não pisar no chão. Tudo parece frio demais ao corpo e quente demais aos olhos. Sinto-me um pouco desorientada, sem saber o leste e o oeste. Sinto alguém me seguindo, não quero olhar para trás.


Como fui parar em Liverpool? De onde eu surgi? Sento ao lado de Eleanor Rigby, materializada em bronze, e fico fitando meus sapatos vermelhos; passo a mão no rosto tentando buscar a consciência (em vão). Nada parece muito real quando não se tem com quem compartilhar; tentei falar com Eleanor:


" - Você era a senhora da lápide ou a menina de 14 anos faxineira no City Hospital, de Parkhill?"


Tento ouvir Eleanor respondendo, juro que tentei, mas ela parece estar fitando meus sapatos vermelhos. All the lonely people observam tudo quando tudo não as observa. Fecho os olhos diminuindo um pouco da ardência e causando sensação de conforto, deixo, lentamente, a cabeça tomar o rumo; inclinada para a esquerda e levemente puxada por um ímã no chão.


Acordo meio zonza e demoro a me acostumar com a luz natural, minhas roupas estão úmidas em consequência ao sereno. Agora tudo é passado. Andei pela Mathew Street procurando qualquer lugar para forrar o estômago com dois goles de café gratuitamente. Não sei como, mas me lembrei de um Paul, que trabalhava no The Grapes Hotel, e tive a flutuante impressão de que éramos amigos. Assim que entrei no Grapes senti um puxão no braço e um menino-homem, aparentando ter 24 anos, começou a falar euforicamente com tom de nervoso:


" - Porra, Julia, onde você se meteu noite passada? Estava louco tentando te ligar, conseguimos um show para sexta!"


Não respondi, apenas tentei juntar as sobrancelhas. Dúvidas abriram a porta rapidamente: uma delas queria saber como o garoto de olhos verdes e cabelo castanho cacheado sabia meu nome; a segunda tentava entender como o mesmo tinha meu número de telefone; a terceira ficava lutando para saber sobre que show ele estava falando; e a quarta, porém não menos crucial, pocurava arduamente se lembrar que dia da semana era. Os olhos verdes se reviraram em polvorosos, contrastando meus olhos castanhos um tanto quanto mortos e pesados.


"- Ah! Já entendi, você tomou Old Eigth denovo. Não adianta, por mais que já esteja claro que você perde os sentidos, a memória e tudo aquilo que se pode perder... você continua tomando essa merda. Oi, sou Paul. Temos uma banda, The What, sou guitarrista e você vocal. Hora de viver!"


Fora então que lembrei de tudo. Eu morava em Liverpool, moro, havia me mudado fazia dois anos para trabalhar como jornalista no Liverpool Daily Post, jornal local. Conheci Paul no The Cavern Club e fiquei julgando a obsessão por The Beatles de todos, até que ele me disse que o nome dele era em homenagem ao McCartney. The What, nossa "banda". Ainda estávamos procurando qualquer baterista e, também, qualquer, qualquer mesmo, baixista. Lembrei do quão ruim era o nome da nossa banda, tentando fazer um trocadilho imbecil com The Who. Só Paul levava com seriedade aquela brincadeira de acordes. Agora tudo é presente.


Tomo uns goles de café gratuitamente e vou para casa tomar banho. Tolice a minha ter achado que ontem era minha primeira noite em Liverpool; logo agora, que começa a ter mais rotina do que café no meu copo.


sexta-feira, 26 de junho de 2009

Nada muito diferente.

O letreiro vermelho luminoso me lembrava os motéis baratos do Brasil, de fato, não eram lembranças agradáveis. Já que estava lá, parada com meu vestido preto de bolinhas, nada muito anos 60, e meia calça, às 10pm; resolvi não deixar o passado tomar decisões e entrei. The Cavern Club. A única exigência era não encontrar espelho no teto; de resto, tudo seria lucro para a primeira noite em Liverpool.


Contrariando pensamentos previsíveis, eu não havia viajado para a cidade impulsionada por meus comprimidos diários dos Beatles; estava lá sem querer. Depois de uns infinitos goles só estava descabelada, com cinquenta libras entre meu seio esquerdo e o sutiã, e em Liverpool! Saldo positivo para uma noite de outono.

Lugar aconchegante,quadro andares abaixo ao solo, de tijolos e teto sem espelho; porém arredondado. Eu conseguia sentir o aroma de jazz na parede, mesmo estando claro que tudo é puro rock'nroll. Todas as pessoas, sem distinção de sexo e bebida, pareciam já ter lido a biografia de John Lenon. Me senti deslocada; nunca tive sequer a vontade de ter paciência para ler sobre a vida do João; 'brasileiramente' falando. Resolvi, ou minhas pernas resolveram por mim, sentar. A mesa tinha lugar para mais duas pessoas e, naquele momento, só tinha um amigo imaginário. Por isso o matei, ia ficar muito óbvio que tinha poucos amigos.

Havia um guitarra saltitando ao fundo todas as vezes que a bateria mandava, contrastando com a falta de originalidade daqueles que a sentiam/ouviam/viam/ignoravam. Meus ombros começaram a ficar descompassados, enquanto um ia para frente, o outro direcionava-se para trás; no ritmo da louca música de UK. Não vou mentir, aquilo tudo era bem melhor do que o Google poderia me oferecer.

Longe, avistei um homem de blusa social branca tentando se esconder atrás do colete preto. Segurava o copo de cerveja como se fosse o último diamante da noite, nunca gostei muito de diamantes e cerveja. Ele olhava compenetrado para o teto se agitando e gritando, da forma mais fiel que o gerúndio possa se expressar. Fiquei com inveja e saí daquela caverna.

Beijei de forma intensa o João de bronze, e coloquei o resto do dinheiro em outro sutiã bêbado.


Selo

Agradecer o blog http://www.indio-indie.blogspot.com/ pela indicação do selo.
Ctrl c + Ctrl v = "Este selo é para blogs que 'demonstram talento, seja nas artes, nas letras, nas ciências, na poesia ou em qualquer outra área e que, com isso, enriquecem a blogosfera e a vida dos leitores'.

Regras:
1 - O premiado deverá expor o selo no seu blog e atribuí-lo a sete outros blogs que considere merecedores.
2 - O premiado deverá responder à seguinte pergunta: O que significa para si ser um Homo sapiens?"

1- Os blogs que estão no canto esquerdo da tela são merecedores.
2- Para falar a verdade, não significa muita coisa palpável. Até agora eu estou gostando.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Meia vinte e sete.

Texto baseado em fatos reais.

Saiu de casa e fez o sinal da cruz com a mão direita, enquanto mantinha em suas costas uma porta fechada. O clima era dispensável. Se estivesse chovendo, iria sem guarda-chuva. Se chovesse no caminho, não voltaria para buscar o guarda-chuva. Se estivesse sol, nem lembraria do guarda-chuva. Vestindo sua calça capri marrom e blusa laranja, uma senhora de oitenta e dois anos ia caminhando em passos de formiga caminhos de elefante.

Todo dia era a mesma coisa. Acordava, arrumava o quarto alugado e se aprontava para almoçar fora. O restaurante é mais conhecido no mundo, Maracanã. Lamúrias por conta de aborrecimentos com a cunhada, dona do quarto que alugava. Não havia se casado, não havia procriado; não se lamuriava por isto. Vestindo sua calça capri marrom e blusa laranja, uma senhora de oitenta e dois anos ia tentando não ligar para os gigantes e viver o constante.

Pegou o meia vinte e sete rumo a praça Sans Peña. Após uma curva brusca na Rodovia Marechal Rondon, decidiu se resguardar em um lugar ao lado da janela. Com alguns fios brancos no queixo, a pequena senhora cerrava os olhos enrugados desviando-se do vento. O banco faz parte do enredo cotidiano, a praça torna-se abrigo para o restaurante dos finais de semana. Vestindo sua calça capri marrom e blusa laranja, uma senhora de oitenta e dois anos ia driblando as vinte e quatro horas diárias com a solidão na cidade grande.

Cachoeira visitou no Alto da Boa Vista; sem ter certeza se estava sozinha ou acompanhada pelo invisível, não se importava. Manter-se em atividade é regra vitalícia. Não, ela não queria acordar por acordar. Escolheu não se casar. Escolheu não se lembrar. Escolheu fechar a porta e fazer o sinal da cruz com a mão direita. Vestindo sua calça capri marrom e blusa laranja, uma senhora de oitenta e dois anos contava seus dias rosados para ouvidos ainda verdes.

Saí de casa e fiz o sinal da cruz com a mão direita, enquanto mantinha em minhas costas mais uma porta fechada.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Adultério.

Acordei com dor de cabeça. O sol estava queimando tudo que encontrava em sua frente. Meus olhos ainda estavam embaralhando e minha roupa ainda mostrava resquícios da noite passada. Olhei para o lado e vi, enterrado no travesseiro e quase coberto com um fino lençol branco, o mais bonito rosto moreno que possa existir entre o céu e o mar. Lembro-me da noite passada, quero tudo agora pela manhã mais uma vez, com um pouco mais de intensidade. O sol estava pedindo mais intensidade, ele suplicava.

Liguei para Leonardo e Denis, amigos de adolescência que sempre sorriem após qualquer proposta. Gosto de idéias que não mostram nexo aparente seguidas de um sorriso largo e malicioso. Leonardo estava namorando por longos oito anos e não queria nem ouvir falar sobre noivado e casamento; Denis era só um garoto na puberdade dos trinta anos. Antes, durante e depois, dessa vez precisava ir até o fim!

Avistei a casa que exalava um calor doce, pude sentir de longe, sentimos. "Nunca é cedo para algumas doses de Whisky e outros drinks, nunca é cedo para entrar no sublime estado de embriaguez" Como já dizia o velho poeta inventado. Incontáveis mulheres de rostos redondos, outras compartilhavam rostos finos. Rostos; todos eles me olhavam sem pudor enquanto tentavam, sem persuasão, enxugar o excesso de sensualidade que estava escorrendo. Certos atos julgavam a si próprios como vulgares. Comecei a ferver por dentro, suava levemente; tudo começava a ficar bem mais sério.

Lembro-me de Joana, aquela de rosto moreno tão incomum, a deixei na cama há algumas horas atrás. O que estava acontecendo comigo? Seria eu mais adultero em um mundo falso moralista; estava gostando disso, ao menos da idéia de ser um.

Agora a garota de rosto fino, suave e claro estava me atormentando, tirando toda a minha paz; se é que um dia já a tive. É sensacional o jeito como ela parece saber como levar essa louca dança imprevisível; quando os movimentos pendem para a lateral, fico tonto, entorpecido. Não me responsabilizo mais por qualquer comando enviado por meu cérebro, desligo a consciência, me entrego à ciência desconhecida.

Vejo-a deste ângulo inferior e percebo o quanto ela é bonita. Joana é a última de minhas mais remotas lembranças que estão se apagando suspiro por suspiro. Antes, durante e depois; dessa vez eu precisei ir até o fim. Ela está tão próxima agora, seu peito feminino encosta em meu peito masculino; seguro-a como se quisesse impedir uma fuga. Meus olhos estão secos e pulsantes, meus olhos estavam secos e pulsantes. Sentimento umidecido de culpa e prazer.

Definitivamente não passo de um adultero em meio da multidão da fictícia conservação, gosto disso.








(Inspiração peculiar : música 'Aldultério' de Mr. Catra http://vagalume.uol.com.br/mr-catra/adulterio.html)

domingo, 19 de abril de 2009

Hora de mudar, ou não.

Todas as vezes que olho para a rua vazia e iluminada artificialmente me dá vontade de gritar. E assim fiz, grito, gritei até que minhas cordas vocais começassem a pedir silêncio. Voltei para casa. Acendo alguns cigarros e os deixo queimando sozinhos, gosto de vê-los em solidão conjunta se desfazendo. Só fumo porque combina com café.

Me afoguei na cama e fito o teto pálido, tremo de calor e sinto meu coração no ritmo de Heart in cage. Cada segundo que passa eu derramo mais e mais adrenalina que não cabe mais em meu corpo. Pego a garrafa que está debaixo da cama, só quero beber o resto da vodka. Essa noite vou queimar todas as crianças que ainda persistem dentro de mim. O barulho do fogo está alto, e eu canto junto sem prestar atenção no que digo, já não importa. Meu quarto está em chamas! Eu me sinto melhor quando estou no fundo do poço, acredite. Tudo soa bem agradável depois.

Caminho com os olhos cerrados até o banheiro e só os abro depois de lavá-los na pia branca. Encarar o vazio do globo ocular é excitante, fiquei mais quente ainda. Tem alguém batendo na porta, escuto de longe; havia alguém esmurrando a porta, senti de longe. Lara, com certeza.

Porra, já falei para essa garota sair do meu pé.

Olhei para a porta e imaginei Lara,vestida com aquele jeans surrado e camisa branca lisa, esboçando um sorriso inocente e apertando os olhos com malicia. Ela só quer um pouco mais de diversão, mas odeio dividir meus ecstasy pessoal. Que horas são? Abri a porta, não há ninguém. O corredor verde musgo é deprimente, quando volto a visão para o apartamento vejo as paredes escorrendo e o chão borbulhando. A fumaça e o calor está me sufocando.

Que horas são?