sábado, 28 de fevereiro de 2009

Versão de Maria

Último dia de setenta e três anos.

Sentei na poltrona desbotada que se encontrava no canto da sala, como sempre fiz durante um bom tempo, as memória me vieram com toda força, me assustei, sempre ouvi dizer que isso aconteceria, mas nunca achei que fosse verdade.

A saudade que apertava meu coração me fez lembrar daquele dia na praça, nos anos 50, quando conheci Antonio, alto, moreno, com aquela roupa branca encantadora.
Sentado do outro lado da praça roubava meus olhares, não conseguia parar de olhar para tal jovem, quando me vi, ele estava estendido ao meu lado, segurando um pacote de pipocas, tentei disfarçar com um sorriso, acho que ele nem chegou a perceber como me encontrava sem graça.

Comi pipoca após pipoca silenciosamente, não sabia o que falar, e ele me parecia estar esperando algumas palavras minha. Levantei e resolvi, enfim, falar meu nome “Maria”. Ele não disse nada, parecia não entender o porquê eu estava me apresentando, aguardei ele dizer algo, sorri novamente, estava sem graça mais uma vez, saí dali o mais rápido que pude.

Passei o dia me remoendo a vergonha, já havia visto aquele rapaz outras vezes na praça, resolvi voltar à noite, tinha a esperança que o veria novamente, pensei em algumas frases para falar na hora que o encontrasse. Assim que cheguei à praça, deixei que meus olhos se perdessem a procura dele, quando em um susto, ele aparece na minha frente e ouço “Antonio”. Ele me olhava nos olhos, e como de costume fiquei sem graça, sorri, mas não ia deixar que aquele encontro se passasse sem falas novamente, respirei fundo com todo ar que meu pulmão pudesse resgatar, e o conduzi pela mão até o banco mais próximo, naquele momento, as frases ensaiadas sumiram, tive que improvisar e driblar a falta de jeito; consegui durante toda a noite.

E assim, por meses, encontrava Antonio na praça, dias e noites. Certa manhã, assim que acordei, sentia-me com um frio na barriga diferente, me encaminhei até a praça, e Antonio me surpreendeu com um pedido, não me contive, meus olhos se encheram de lágrimas involuntariamente, era o que mais queria, sorri, mas não porque estava sem graça dessa vez, sorri com a felicidade que borbulhava em todo meu corpo.

Compramos uma casa azul, em frente à praça, tivemos dois filhos, Julia, a caçula, que está grávida novamente, e Bernardo, que junto com sua bela esposa havia me dado um grande presente uma dúzia de anos atrás, dois netos lindos, Luis e Gabriel, gêmeos. Antonio tinha câncer no pulmão, devido ao charuto; sentado na mesma poltrona que me encontrava, quando silêncio habitou a sala, trocamos olhares e sorri com delicadeza, foi o começo de anos vazios. Acabei perdendo-me em tristezas, a poltrona era minha companheira mais constante, as crianças já haviam crescido, e meus netos só me visitavam nos fins de semana.

Abri os olhos, e olhando para o lado, percebi a fresta na janela que deixava o sol entrar lentamente, pela primeira vez não me sentia sozinha, parecia que Antonio estava comigo novamente; uma confortante sensação, sorrir com todo meu amor era pouco: a última coisa da qual me lembro, tudo foi lentamente desaparecendo.

Selo



Gostaria de agradecer ao Felipe, do blog 'Na mira do Felipe' (http://namiradofelipe.blogspot.com/), pelo selo.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Carnaval

A Escola de Samba Beija-Flor aborda no carnaval de 2009 temas relacionados à prática do banho e seus benefícios, assim como os malefícios durante a ausencia do mesmo. Carros com micróbios representados como macróbios, chafariz e cachoeiras. Foram utilizados 5 mil litros de água para o desfile. Irônico é dizer que no bairro ao lado, Bangu, moradores clamam a atenção da SEDAI em um coro com vozes infantis e maduras.

É difícil dizer o real sentimento pelo carnaval, lógico que como carioca eu participo de toda euforia que o samba provoca, mas como indivíduo com um certo senso critíco ainda me permito pensar sobre questões que acontecem no feriado festivo. O exagero é elogiado, parece que por 4 dias a beleza se resume em abundancia.

O nome vindo da expressão "carne vale", o carnaval, onde a carne de nada vale, vem sendo festejado geração após geração. Aprecio a simplicidade das marchinhas do carnaval de rua, os enredos que antes eram feitos com amor e riqueza cultural. Ano após ano a maior festa, não só do Rio de Janeiro, vem se rendendo, cada vez mais, ao que chamo de produto negativo da mídia.

Quando ninguém é de ninguém, mulheres com coxas torneadas sambam em cima de saltos finos com 15 cm e mostram seu corpo na festa da carne. Parece que todos se esquecem que Rio de Janeiro não é Brasil. A Sapucaí é, de fato, uma grande festa, mas ao contrário do que muitos pensam e propagam, não é a maior do Brasil. Salvador ganha disparado do Rio de Janeiro, chega a ser ridículo como nos fazem acreditar que o Rio de Janeiro é o berço do Carnaval.

Não aguento mais gostosas rebolando e famosas sendo rainhas quando nem sabem sambar. Em um mundo onde deveríamos evoluir, percebo em vários aspectos que só retrocedemos. O resgate do bom e velho carnaval é fundamental. Chega de abundancia quando poucos vivem a mesma realidade. O engraçado é que são comunidades carentes que gastam fortunas com o desfile aqui no Rio de Janeiro. Respeito e partilho o amor pelo samba, mas tudo tem limites.

Agradeço as Escolas de Samba que são a exceção e utilizam materiais recicláveis na produção de seus carros, e, principalemente, utilizam da mídia como forma de propagar idéias positivas, pena que quase ninguém preste atenção nas letras.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Confusão mental.

Não me chame de louco por afogar flores em lágrimas. Gotas de pétalas e lágrima de flores. Gotas de Lírio vindas do seio em forma de leite. Chame-me de louco por afogar flores em água ou gotejá-las em águas afogadas. Chame-me de louco, vai.

Não me chame de louco por tomar banho com minha melhor roupa. Desabotoar botões um por um é tão só quando feito por mãos conhecidas. Quero desconhecer o desconhecido e banhar-me desabotoando cada pingo do chuveiro que cai do botão. Chame-me de louco, eu gosto.

Não me chame de louco por ser maestro da chuva. Apavorando os apavorados com tenores naturais e guiando o não guiado pela melodia de cada mililitro que cai da imensidão cinza. Brilho que acaricia a terra antes acariciada pela carícia de pés rudes. Molho o que antes estava seco querendo secar o que depois estava molhado na orquestra chuvosa. Chame-me de louco, quero ouvi-lo, enfim, me chamando de louco.

Deixe que meus tímpanos estremeçam, permita-se gritar enquanto me chama de louco. Chame-me do que você quiser, mas não me chame de louco só porque pedi.

Por favor, me chame de louco.

Selo


Gostaria de agradecer o selo indicado pelo blog Casa do Besouro (http://casadobesouro.blogspot.com).
Regras:
1) Exibir a imagem do selo "Seu blog é ROXIE!" e escrever essas regras abaixo dele.
2) Colocar quem te deu o selo nos seus blogs indicados (amigos).
3) Escrever 5 coisas que são ROXIE (1ª sobre música, 2ª sobre televisão e cinema, 3ª três países que gostaria de conhecer, 4ª três cores favoritas e 5ª três Hobies)
4) Indicar 10 blogs que você ache ROXIE.
5) Avise a pessoa (claro néé)
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1- The Beatles e Cazuza.
2- Não sei.
3- Cabo Verde, Cuba e Hawaii.
4- Azul, branco e verde.
5- Dormir escutando música, ler e tocar violão.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Gostos e não desgostos

Gosto dos que não bocejam, dos que sentem sede e são saciados por gotas de vivências, dos que dizem não quando seria sensato dizer sim e dizem sim quando o óbvio ligava-se ao não, dos que são simples entre goles de vinho tinto e dos que não tentam ser o que gosto.

Gosto das manhãs que exalam maresia, das tardes que preenchem o dia e das noites que superam expectativas. Manhãs que acolhem, tardes que curtem e noites que dispedem-se.

Gosto de saber que meu gosto pouco lhe intressa, pouco lhe faz diferença, pouco lhe acrescenta. Gosto de saber que tudo que antes achei que fosse se desfez deixando dúvidas. Até do escuro que trouxe atos, dos goles que trouxeram conversas, da falta de memórias que provocou revolta, das desculpas ditas e não entendidas; até dessas eu gosto.

Gosto de parecer não estar aqui, não estar aí e não estar lá. As vezes que fingi não ligar, fingi não gostar e fingi achar, gosto delas também.

Você gosta? Gostou? Ao menos, fingiu não desgostar?

Gosto de tudo, desgosto de nada.