segunda-feira, 23 de abril de 2012

É isso, sou isso.

Agora, sozinha no quarto, encolhida em um canto, percebo que estou fadada a ser pra sempre mulher. Mulher do padeiro, do pedreiro, do governador, do vizinho, da vida. Mulher de ninguém, mulher de mim mesma. E é sendo o que sou que um dia deixarei de ser o que jamais quis: uma, mais uma. Afinal, o que todos querem é deixar de ser mais do mesmo.

Agora, sozinha no, deixo o cigarro queimar a ponta dos meus dedos e a carne de meus lábios. Faço o que quero com meu corpo, com meu rosto, com meu espírito. Se é que existe algo além da matéria, algo além desse inferno que é estar aprisionada em quilos de carne e litros de água. O que me faz mulher não é ser o oposto de homem.

Agora, sozinha, consigo ouvir nesse vazio quieto o som do sangue que corre e dá voltas, voltas, voltas e mais voltas. Ainda estou fatalmente viva. Viva e nada mais que isso.Todos os dias meu corpo faz as mesmas as coisas sem parar. O coração bate, meus olhos piscam e meu cérebro pensa.

Agora, percebo que não dá pra querer não existir. Naquele momento, eu não posso fingir que estou em outro lugar. Ali, não dá pra me colocar em outro corpo, me retirar do meu. Estou fadada a ser mulher. Fadada a ser sua, ser do outro, ser de quem pagar para que seja. O que me faz ser mulher é você querer que eu seja.

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